sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Cenário para o crescimento do PIB em 2014 (PARTE II)

Voltei! Deu mais trabalho que pensei. Respira fundo e se prepara para a aventura. A tabela abaixo mostra a contribuição (em %) das variáveis consumo (C), investimento (formação bruta de capital fixo + estoques) e exportações líquidas (BC) para o crescimento do PIB, entre 2006 e 2012 – não incluímos 2013 porque os dados do último trimestre ainda não estão disponíveis.


O cenário especulado toma como base algumas proposições macroeconômicas simplificadoras e explora a relação “ambiente externo adverso + câmbio valorizado = redução de investimento”, com passagem extremamente relevante pelo novo patamar de consumo das famílias brasileiras e por 2010, ano de forte acúmulo de estoques. Questões de âmbito microeconômico (produtividade do trabalhador, falta de inovação tecnológica, etc.) relacionadas à competitividade da indústria ainda não serão tratadas. O foco é a retomada do investimento em 2014, apesar da política econômica míope/guerra psicológica (fique à vontade para escolher).

1) Ambiente externo adverso
Crises com a do subprime e a da zona do euro afetam negativamente as expectativas dos agentes – mudam a percepção dos consumidores quanto ao avanço da renda e a percepção por parte das firmas sobre a evolução de suas vendas (tanto internas quanto externas). Então, dado o cenário externo adverso, o consumo privado tende a cair, o investimento tende a cair e as firmas se desfazem ou deixam de acumular estoques. Veja o que aconteceu em 2009 (tabela).

2) Real mais forte
A política monetária agressiva dos EUA afetou as taxas de câmbio por todo o mundo e, somada com a política fiscal brasileira persistentemente expansionista (aqui), apreciou o Real. O Real apreciado frente ao dólar (ou seja, dólar mais barato) favoreceu as importações, que competiram com os produtos nacionais, e encareceu as exportações brasileiras, prejudicando as firmas locais. Observação: o dólar mais barato em 2010 foi importante para a absorção doméstica preencher a capacidade ociosa proveniente de 2009. As firmas puderam importar insumos mais baratos para a fabricação de seus produtos e as famílias puderam consumir sem que houvesse forte pressão inflacionária. Porém, em 2011, o Real continuou sua trajetória de apreciação, com o dólar chegando a R$1,55 no mês de julho.

3) Desequilíbrio em 2010
Aqui o nosso ponto: o volume de investimento alcançado entre o último trimestre de 2009 e até o primeiro semestre de 2011 foi excessivo e não se realizou, como o esperado, em vendas. Esse investimento, que cresceu a uma taxa média de 16,2% entre 2009T4-2011T2, concorreu com o cenário externo desfavorável, as importações mais baratas em 2011/2012 e, principalmente, com a redução do consumo das famílias. Tomamos 2010 como ano chave desse desequilíbrio (olha a tabela, FBKF + estoques). Veja que esse nível de investimento foi puxado por um crescimento não menos impressionante do PIB – média de 6,2% no mesmo período. Note o mecanismo de transmissão: o alto crescimento do PIB aumenta o lucro atual, o alto crescimento do PIB esperado aumenta o lucro esperado e essa percepção de lucro alto (atual e futuro) afeta o investimento hoje. Veja também que o ritmo de consumo das famílias, entre 2009T4-2011T2, em média, foi de 6,71% e que, entre 2011T3-2013T3, caiu para 2,77% (olha o gráfico).


De forma mais clara, a “impressionante” recuperação do Brasil diante da crise do subprime (primeiro choque externo adverso) se refletiu em forte aumento da formação bruta de capital fixo e de estoques (veja na tabela). Com o aprofundamento da crise da zona do euro em 2011/12 (segundo choque), a demanda externa foi novamente reprimida e as exportações caíram. Além disso, e, principalmente, a demanda interna diminuiu – a contribuição do consumo das famílias para o crescimento do PIB declinou a partir de 2011. Depois de exauridos os ganhos da redução da taxa de desemprego/incremento da renda no mercado de trabalho, esse novo patamar da contribuição do consumo das famílias para o crescimento econômico parece ser natural e não parece ter sido previsto. Você também pode considerar o cenário externo adverso como outro fator de redução do consumo privado (expliquei lá em cima).
Tudo isso exigiu um longo ajuste para baixo dos estoques por parte das firmas, que ainda competiram com as importações baratas (real apreciado/dólar mais barato). Então, mesmo com a redução da taxa de juros, oferta maciça de crédito barato via bancos públicos, desonerações tributárias, entre outros subsídios, só houve reação do investimento a partir de 2013 (gráfico).
Com o ajuste dos estoques das firmas brasileiras, câmbio desvalorizado (dólar mais caro, valendo R$ 2,39) e uma sensível melhora do crescimento das economias avançadas, bem como a continuidade dos programas de concessão de infraestrutura/petróleo, o Leruaite espera um aumento do investimento em 2014.
Que os meus três leitores (fala, pai!) não tomem como verdade absoluta o que foi exposto. Estamos interessados em mudar o foco da discussão atual sobre o crescimento de curto prazo. Nada fez sentido? Encontrou alguma inconsistência? Comente! Ainda volto ao assunto (miopia revisitada e inflação). 

4 comentários:

  1. Uma dica. Seria interessante analisar o nível da capacidade ociosa na industria, assim dá pra ter um noção do comportamento da inflação em caso de retomada do crescimento.

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  2. Marcelino, pode ser que esta inflação fora do centro da meta (que tu comenta na parte I) também esteja atrelada aos ajustes de salário não acompanhados de aumento da produtividade do trabalhador. Fiquei curioso para saber como tu fez a previsão de crescimento do PIB para 2014. Parabéns pelo blog!

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    1. Obrigado pelo comentário, Felipe! Concordo com você. O próximo post deve abordar inflação para fechar as previsões de 2014. E sobre os 3%, simulei a contribuição de cada variável para o crescimento do PIB esse ano (baseado na tabela do post). O consumo final nesse novo patamar (2,4-2,8%), porém com uma retomada razoável do investimento. O PIB estaria perto do seu potencial (essa discussão ainda vai rolar). Não deu para ser mais otimista por causa dos fatores citados na parte I.

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